Thursday, March 16, 2006

Momento transparência

Momentos bastante duros esses de agora. Uma vida vazia a minha, vazia de compreensão, de ternura, de gratidão. Gente me chamando das mais diversas coisas ruins. Gente achando as mais diversas coisas más sobre mim, sem coragem de dizer. E eu apenas uma pessoa totalmente igual a todas as outras e triste sim, muito triste porque tem muito sofrimento mesmo que vou passando, na imensa maioria sem que ninguém, ou quase ninguém saiba. Nessa imensa e tenebrosa vereda, amigos de verdade, que são luzes neste caminho sem caminhos, neste desenrolar do tempo, inexoravelmente caótico e belo, cósmico. Tenho a felicidade imensa de ter amigos, sim, isso tenho. Se não fosse por isso, nem sei o que seria... talvez a enxurrada astral que vem sobre mim seria apenas demais para se agüentar.

Enxurradas astrais de valores recalcados pelos outros, e que se atiram raivosos sobre a minha pessoa, me acusando de tantas e tantas coisas... se acusando também, das mesmíssimas coisas...

Daí a solidão ser uma conseqüência inexorável também. Uma solidão essencial, não apenas ausência de pessoas, uma coisa simplesmente muito mais profunda do que isso, como um vazio desesperador, como uma ausência de teto, de aconchego, do fogo sagrado de Agni, cuja lareira aquece e dá vida ao coração. Uma solidão transcendente à mera ausência, frieza outonal, encerrando os calores e alegrias quase infantis do verão. Uma solidão de quem sabe que sempre procurou por alguém, que talvez simplesmente não exista, e nunca existiu. Uma carência, sim, mas essa que vem dessa mesma procura inexorável. Não dá para seguir o sábio conselho de “deixar de procurar”. É o coração quem procura, e ele, não tenham a menor dúvida disso, tem vontade própria e é tão livre que nem eu mesmo posso nada frente a ele que não simplesmente seguí-lo por onde ele me levar.

Perdi muito com isso, não resta dúvida. Sinceridade na hora de ser dissimulado. Coragem, na hora de se ter medo e recuar. Compaixão quando o certo era a dureza fria e calculada. Nem ganhei nada com isso também não, ninguém se iluda. Seguir o coração. Apenas os rótulos negativos que me acompanham por onde eu vou. E com eles mais funda ainda aquela querência da paz do lar.

Domingo último, um passarinho na montanha sagrada, São Lourenço, que canta como nunca ouvi nenhum, dá a impressão das sete notas da escala, ou mais ainda, dele me surgiu na mente um ensinamento. Era sobre o egoísmo. Não aquele da ausência de altruísmo, ou seja, o contrário do “pensar nos outros”. Não. O egoísmo como uma cristalização da alma que em tudo que faz sempre se ocupa consigo mesma. Muitos poderão dizer que isso não é ruim, nem mesmo egoísmo. Mas o que vi é que isso se torna uma terrível couraça que nos impede de viver simplesmente a terrível beleza da vida. Sabe... nem sei qual a conseqüência exata para mim amanhã do que eu faço hoje. Sei que prejudico alguém ou não, sim, aquelas coisas normais, básicas. Mas falo daquele conjunto de coisas que pela própria sutileza, nuances de valores, nem que bons ou ruins claramente, nos levam apenas às preocupações cotidianas com a imagem, e com o atendimento interessado de expectativas alheias.

Sim. Ir à montanha Moreb é sempre aprender algo. E aprender vendo. Vi este egoísmo. Vi em mim mesmo. Diferente das árvores, cipós, folhas, pedras, pássaros e elementais da natureza, que formam um todo fractal de beleza, o egoísmo é todo simetrias puras, quadrados e cones, esferas e cubos que não existem na natureza, mas que simplificam facilitando tanto as coisas para a nossa mente pequena... Sim, pois não têm as inconsistências e contradições da natureza, as quais somente nos mais profundos harmônicos, no mais universal conjunto, encontram a beleza e a coerência. Uma formiga passando, um passarinho cantando, uma trilha que mais e mais se fecha, uma folha movimentando-se rápida e sem qualquer vento a agitá-la, tudo isso totalmente contraditório e isolado, complexo, caótico, no todo, na teia deste organismo, é a mais potente coerência.

Uma alma assim floresta é adaptável e profunda, complexa e simples, delicada e poderosa, volitiva e compassiva, livre e fiel, jovem e anciã. É unilateral esta alma, mas, despretenciosamente joga moedas para o alto, e as pega todas, quando o normal era considerá-las todas em risco de se perder. Moedas e valores jogados para o alto, despretenciosamente, com um sorriso maroto nos lábios, apenas uma aparente diversão. Mas que caem inexoravelmente seguras na palma da outra mão, como nenhum cartesiano e mal humorado normatizador do mundo e ordenador do tempo poderia ser capaz.

É isso que acontece no fundo de um coração buscador que tenho. Enquanto dele vão sendo lançados sentimentos e afeições, a uma pessoa ainda encoberta pelas “dobras do mistério”, desta mesma pessoa as mesmas afeições e os mesmos sentimentos retornam inexoravelmente como se fosse uma dolorosa mensagem de existência. Mas a persona, aquilo que os outros vêem, o rosto, é apenas a brincadeira cotidiana, piada, cantada e gargalhada que existem para apenas deixar incógnita a verdade funda e dolorida que segue sendo lançada e sendo captada por um alguém desconhecido demais.

Missão cumprida, talvez, a desta vida... Sim, talvez sim. Hora de extermínio ou de morte? Não. Digo à divindade, Eis-me aqui. E sempre direi isso, dividindo sacrifícios anacrônicos que já deveriam há muito terem sido ultrapassados. Mas talvez apenas Eis-me aqui para servir de isolada e solitária antepara. Outros devem estar caminhando e se encaminhando ao porvir, assim mais protegidos, assim para eles mais suportável a existência que se vai ao Eterno, ao de venir, da divindade.

1 Comments:

Blogger Peres said...

bem Legal esse post... tem tudo a ver com o título, e mais é bom ver que muitas coisas precisa apenas de um passarinho cantando pra nos desen-cantar...
Abraço forte, valoroso amigo!!!!

AT NIAT NIATAT

2:09 PM  

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